É extremamente comum, hoje em dia, principalmente às últimas gerações, que tem uma visão simultaneamente ideologizada pelo capitalismo imperante e enfraquecida pela falta de observação analítica do real funcionamento desse sistema, enxergar o capital, o lucro, como um direito daquele que merecidamente trabalhou para adquiri-lo. É comum até mesmo interpretar o dinheiro não como um intermédio de troca de produtos, segundo sua concepção originária, mas como um próprio bem adquirido e que garanta uma determinada riqueza (palavra avaliada aqui como uma preponderância de um indivíduo sobre o outro, em termos econômico-sociais; marca da desigualdade social), assim como certo status conferido pelo sistema atual.
O filosofo alemão Karl Marx foi o pioneiro a discutir sobre esses valores da sociedade capitalista. Graças aos mecanismos próprios do sistema, ficam implícitas as diversas formas de dominação do capitalismo burguês sobre a maioria operária (proletariado). Assim, o sistema capitalista resume-se pela relação de dominação daqueles que possuem meios de produção sobre aqueles que não têm. Os mecanismos de dominação capitalista intensificaram-se a partir da Primeira Revolução Industrial, com o início da produção em larga escala. Eles vão desde a exploração do trabalho, a extração da mais-valia até a acumulação gerada pelo consumismo individualista. A exploração da classe dominante sobre a dominada ultrapassa a lógica da troca e entrega-se à lógica do lucro – o proletário, proveniente de uma classe historicamente dominada, vende sua força de trabalho (único bem que possui) para o capitalista, detentor dos meios de produção. O modo de produção força que o proletariado aceite uma situação degradante em que sua força de trabalho não corresponde diretamente a seu retorno no que se convencionou por salário – há ainda uma mais-valia, a força de trabalho não paga pelo capitalista, que permite uma exploração cada vez maior e mais forte. Concomitantemente, seu trabalho para a ser cada vez mais especializado, o proletário perde a noção do processo como um todo e aliena-se da produção e do produto, tal qual retratado em Tempos Modernos, de Charles Chaplin – o homem desumaniza-se em prol do capital e da dominação de uma classe que extrai daquele que nada mais tem senão sua prole o máximo, sem que haja retorno ou possibilidade que os poderes de tais classes se equiparem sem a revolução.
Outra forma de dominação é feita por parte do Estado. Já que o proletário vê-se dependente do salário e há concorrência que pode tirá-lo do pouco que tem, graças a uma parcela da população mantida desempregada e à margem (parcela sempre necessária para garantir o sistema tal como é), é fácil para o governo reprimir qualquer reação aos abusos. A miséria aumenta à medida que o lucro também aumenta, e para sair da miséria que o próprio regime capitalista impõe, o indivíduo vê-se obrigado a trabalhar ainda mais, sem sair deste ciclo. Há ainda uma valoração dada ao “trabalhador”, ao trabalho que glorifica, justificando os esforços desumanos de quem luta para sobreviver em um sistema excludente por definição. Neste momento o medo do desemprego é suficiente para acalmar uma possível revolta, e o capitalismo promete segurança enquanto o proletário necessita do próprio sustento. O poder político, então, é um meio pelo qual a classe dominante mantém seu domínio e exploração.
Marx já dizia que era preciso entender matematicamente a situação do capital, explicitar como se organiza, conhecer o sistema capitalista para modificá-lo e não apelar para teorias utópicas (assim como os ideais do socialismo utópico), para que assim e só assim pudesse haver alguma modificação no sistema. Segundo o pensador, “não é a consciência dos homens que determina o ser social. Ao contrário, é o ser social que determina a consciência”.
Em suma, levando em consideração as discussões feitas por Karl Marx, a maior dominação é a que aliena o homem e o torna dependente do sistema, garantida pela ideologia propagada por diversos recursos do sistema, entre Estado, escola, prisões, hospitais e até mesmo a estrutura familiar – estudados mais a fundo por Michel Foucault. O modo de produção influencia o desenvolvimento da vida social, política e intelectual. A consciência do homem será determinada por sua existência social, e o trabalho passa a ser visto como modo de existência, um meio de viver e fazê-lo parte da sociedade. A noção de trabalho torna-se elemento essencial para uma definição do homem, e não uma expressão, graças à ideologia e à alienação. Segundo Raymond Aron, “interpretada sociologicamente, a alienação é uma crítica ao mesmo tempo histórica, moral e sociológica da ordem social da época. No regime capitalista os homens são alienados, eles mesmos se perderam na coletividade, e a raiz de todas as alienações é a alienação econômica.” De fato, o indivíduo perde-se no que é propagado às massas e passa a ser dominado pelo capital graças a esse tipo de mecanismo. Dominado, controlado, alienado.
Júlia Dolce Ribeiro - RA00132140 (aiai, somos só números dentro do sistema) said:
Achei o texto de vocês sucinto e ao mesmo tempo esclarecedor, conseguindo contemplar os diferentes mecanismos de dominação do Capital sem se perder em explicações redundantes. No meu blog, ao responder a questão, o grupo também citou os processos técnicos do sistema capitalista. O modo teorizado por Marx que analisa sua formação como um objeto, matematicamente. Assim, também consideramos o processo de obtenção do lucro, envolvendo a exploração do trabalho através da Mais Valia e a divisão manufatureira alienadora; assim como a repressão direta e indireta que o exército de reserva sofre; como meios de dominação. Porém, na minha opinião, o mecanismo de dominação mais efetivo atualmente é o poder psicológico que o sistema capitalista exerce sobre nós. O fato de nós termos sido criados nesse sistema, e formados a partir dessa Ideologia. Vocês mencionaram a glorificação do trabalho, assim como o papel vigilante e formador das instituições que nos cercam; mas acredito que além disso, há algo mais profundo que nos aprisiona à esse sistema, e que diferentemente dos primórdios do Capitalismo, na Revolução Industrial, onde os processos técnicos organizacionais do sistema capitalista eram explícitos, e poderiam ser matematizados facilmente; nos dias de hoje os meios de dominação são principalmente implícitos: temos a Ideologia interferindo e moldando nosso inconsciente ininterruptamente.
Como vocês citaram: “não é a consciência dos homens que determina o ser social. Ao contrário, é o ser social que determina a consciência”.
O fetichismo de mercadoria no faz assumir o papel de coisas, pois as nossas relações sociais são mediatizadas por coisas. Assim, mesmo que os outros mecanismos de dominação do Capital se extinguam, mesmo que não haja mais exploração, instituições autoritárias, exército de reserva ou a divisão entre os donos dos meios de produção e o proletariado; ainda teremos as nossas mentes moldadas por esse fetichismo, ainda estaremos acostumados a nos tratarmos como objetos e a depositar o que chamamos de felicidade na posse de objetos.
Portanto, acredito que esse meio de dominação (o valor que atribuímos às coisas), tão subjetivo e violento, teria de ser contemplado como o maior problema para aqueles que tem como desejo o fim do sistema capitalista; pois sua destruição depende de uma completa revisão de valores e cultura.
Rodolfo Zanchin said:
Vale ressaltar o que foi superficialmente conceituado sobre o exército de reserva: concebe-se como um desemprego estrutural, ocorre quando o número de desempregados é maior do que as vagas restantes no mercado de trabalho, o que faz uma população ativa se tornar ‘reserva’. O aumento de um capital constante por meio da troca de operários por máquinas também auxilia na manutenção desse exército. Com isso, Marx define-o como um inibidor de reivindicações trabalhistas, já que o empregado teme perder sua vaga e além disso contribui para uma queda no piso salarial.
Giovanna Patelli said:
A abordagem do texto com relação aos mecanismos atuais, a crença do capital e o esquecimento da real forma de enriquecimento justo foi muito bem colocada. Os meios de dominação passam do monetário para o psicológico, alterando a forma que é debatida e colocada na sociedade. Saem do meio comum para o individual, onde as regras são impostas por medidas sociais e culturais, que agregam modos de viver irreais para a vida em conjunto. As diferenças saem das fábricas e se instalam em todos os meios, levando ao aprisionamento do ser, que esquece de seu real valor e aceita todo o tipo de situação imposta pelas formas de repressão.
Giovanna Patelli J. Machado RA00134990
Beatriz Helena Arias Avila said:
Beatriz Helena Arias Avila – RA00130140
A análise do blog está muito boa. O texto consegue discutir os mecanismos de dominação do capitalismo, explorando principalmente o esvaziamento do significado do trabalho e a problemática do exército de reserva. No entanto, faltou falar mais sobre a ideologia construída pelo capitalismo, principalmente no que diz respeito à propaganda. Alimentar o consumismo faz o sistema de produção funcionar e gerar lucro, mas também desperta no ser humano o desejo de consumir. Para comprar, o indivíduo tem que trabalhar e ganhar dinheiro. Ou seja, para adquirir as mercadorias que deseja, ele tem que se adequar ao sistema capitalista – o que não deixa de ser uma forma de dominação.
Vivian Prochno Monicci - RA00133569 said:
Excelente texto! O grupo trabalhou de forma detalhada e conexa os conceitos fundamentais de Marx relativos aos mecanismos de dominação, como a exploração do trabalho, a mais-valia, a alienação, o poder político da classe dominante. Vale ressaltar ainda a menção muito apropriada que o grupo fez ao filme Tempo Modernos, que sustentou e ilustrou o que foi dito, bem como a menção que o grupo fez a Michel Foucault, que estuda mais a fundo alguns assuntos apresentados por Marx, como a dominação e a alienação. Porém, o grupo poderia ter falado sobre o período de acumulação primitivo de capital, anterior ao capitalismo, baseado no sistema de troca simples, onde era estabelecida uma relação de equivalência entre as mercadorias, facilitando o intercâmbio das mesmas. Tal fato foi essencial para que Marx questionasse como era possível existir o lucro se, a princípio, o dinheiro (um equivalente geral) servia apenas para facilitar o intercâmbio de mercadorias. E foi isso que deu origem a toda sua teoria sobre a exploração do trabalho, que é muito bem analisada pelo grupo, mas que poderia ter sido contextualizada com a questão do sistema de troca simples.
Vivian Prochno Monicci – RA00133569
bembolado01 said:
Que comentário fantástico. Muito interessante. Creio que vocês conseguiram refletir sobre todos os mecanismos de dominação do capital analisados pelo filósofo alemão Karl Marx. Gostei muito da introdução, na qual vocês explicam que o capital, “lucro”, acabou perdendo seu verdadeiro significado ao longo do tempo. Foi muito interessante a parte em que vocês citaram que as visões das pessoas em relação ao capital estão todas ideologizadas pelo capitalismo. Muito bom que vocês comentaram sobre o filme Tempos Modernos, de Charles Chaplin. Para refletir sobre a questão dos mecanismos de dominação e embasar ainda mais meu comentário (que acabei publicando no blog do nosso grupo) eu, igualzinho a vocês, também fiz uso deste clássico do cinema. Acredito que ele ajuda muito para as nossas reflexões, pois na realidade, o filme é uma metáfora que mostra como a divisão manufatureira do trabalho também é um processo produtivo que acaba gerando alienação e dominação no homem que está inserido no sistema capitalista. Entre os que eu tive a oportunidade de ler, esse foi o comentário que mais me atraiu. Ótimo que vocês não deixaram de citar o poder politica que o Estado tem sobre os operários. Esses trabalhadores têm de aceitar essas injustiças de forma passiva, isto é, sem criticar suas condições, pois sabem que há a concorrência no trabalho. Fiquei impressionado também com a facilidade que vocês tiveram para explicar os mecanismos de dominação do capital. Creio que um leitor que não tivesse noção do tema, ao ler essa reflexão publicada por vocês, conseguiria extrair o verdadeiro contexto do tema abordado. E acredito que, através dessa análise, ele teria ainda mais vontade de se aprofundar nessa questão. Estão de parabéns!
Marcus Rönn Leite
RA00135779
MA1